Mozart, uma vez mais. O Requiem. Cantei-o no sábado, em
Torres Novas. 50 minutos de dilacerante beleza, ora grave, ora alegre, ora
mesmo exultante, à memória de alguém, dos outros, da nossa, mas, para mim,
primeiro que tudo, à memória dele, que os escreveu em boa parte, e à do amigo
que lhe os completou.
É tão diferente ouvir de dentro, do palco, quando se canta. Confinados
à disciplina das nossas vozes, perde-se a noção de conjunto, mas ganha-se na
perceção dos diálogos e dinâmicas entre naipes, da construção das harmonias. As
fugas, por exemplo: o Kyrie… como soa tão diferente ouvido numa gravação ou lá
em cima do palco, quando as vozes femininas flutuam, urgentes, por cima da
gravidade pungente dos baixos…
E ver, cá de trás e de cima, mais alto que a orquestra, é
também outro enorme privilégio: o trabalho de todos, o conjunto, a concentração
dos executantes, o vai-vem síncrono dos
arcos, o grito dos metais, o circunspecto ribombar dos tímpanos, as mãos que
dirigem como apêndices do olhar do maestro…
E depois, quase no fim, responder à doçura implorante do soprano com a mesma prece: “Lux aeterna,
Lux aeterna”...
Há alturas em que é mesmo bom ser!