sábado, 27 de maio de 2023


Da dúvida e da troca


Fosse a  honra ou a virtude

fosse estar bem de saúde

fosse um porvir lisonjeiro

fosse ter muito dinheiro

fosse perene alegria

fosse viver mais um dia

fosse um cargo no governo

fosse ser p'ra sempre eterno

fosse casa na Caparica

fosse ganhar o benfica

fosse certo que te amava

e outras coisa que não vejo

meu amor tudo trocava

por um beijo frente ao tejo...


terça-feira, 23 de maio de 2023

Um conto de praceta 

Corroios, num fim de tarde, com chuva.




As duas árvores olham-se, de amor tomadas.

Gratas pelo vazio que sobra nos bancos, agora que o céu deu em chorar, (talvez pura inveja das nuvens) e que os avôs, quotidianos companheiros do correr do nada,  tornaram a casa para se protegerem das grossas lágrimas, ousam o que calam no ardor do segredo.

"Amo-te", disse uma.

A outra, coquette armada, fingindo surpresa, responde tão  baixinho, que só quem soubesse ler a tremura pueril das folhas - e a companheira bem o sabia -  ouviria igualmente o delicado protesto: "Eu também!".

Envergonhado por me ter admitido em tamanho segredo, voyeur de fim de tarde, estugo o passo, não sem antes lançar olhar um último olhar aos improváveis amantes.

Atónito, descubro então a surpreendente verdade: as árvores quando  coram....ficam lilases! 

segunda-feira, 1 de maio de 2023

 Mês a mês, contado à vez.


I - Abril


Descansa agora bom abril, 

bem o mereces, por inteiro,

sussura um céu azul anil,

que faz do dia travesseiro


Lençol de trigo eivado a flores,

tela de artista, aguarela

de todas e mais outras  cores,

qual delas a mais pura e bela...


Descansa pois meu bom abril,

descansa que eu daqui não saio;

só nao trouxeste as águas mil...

será que as deixaste p'ra maio?