sexta-feira, 16 de dezembro de 2022
quarta-feira, 13 de julho de 2022
Transparente como um mal que lento anoitece
sem se dar porquê, sinto o calor que dobra as folhas
já pálidas de cor.
Refugio-me
na lembrança do mar.
Desenham no ar elipses, que
rompem aos gritos
como se a geometria do voo fosse
pendão inimigo
ou, simplesmente, pecado.
Abrem as asas ao vento que lhes acossa
as penas
de quente, quase inverosímil,
sustentação
e gritam
mais alto que o espumar túrbido
das ondas
O barco está já na areia.
Os homens também.
Sobra o frenesim urgente,
suplicante de ar
no atropelo de uma rede
cheia
de vida, também ela transparente,
a diluir-se num último estertor, sôfrego,
na areia
ou no bico de uma gaivota.
Na rua passam carros,
algumas pessoas
apesar de tudo
e da promessa de mar
que me ofereço
para resguardar a pele
sem me ter que lambuzar.
sábado, 30 de abril de 2022
GR11-E9 (Parte 4) - Trafaria - Cacilhas
GR11-E9 (Parte 3) - Fonte da Telha - Praia do Meco
GR11-E9 (Parte 2) - Praia do Meco - Cabo Espichel
GR11-E9 (Parte 1) - Trafaria - Fonte da Telha
E porque não continuar? a ideia não me saía da cabeça há já algum tempo porque, depois de ter concluído a ligação da Trafaria ao cabo Espichel, fazia todo o sentido continuar até ao acidente geográfico que determina o início da "margem Sul", por isso, na tarde soalheira de véspera de Dia da Liberdade, meti-me a caminho de carro, de novo, até à Trafaria, para de lá partir para calcorrear a estrada que leva a Cacilhas.
O caminho é todo feito em asfalto e não é particularmente difícil, embora os primeiros dois quilómetros sejam sempre a subir, desde a estação fluvial da Trafaria até ao cruzamento para o Murfácem. Mas como a seguir a uma subida, regra geral, há de haver uma descida, não é nada que qualquer caminhante, minimamente habituado a andar, não faça com facilidade.
Farol da Serreta, Ilha Terceira, Açores |
terça-feira, 22 de março de 2022
Dia Internacional da Árvore
Dia Mundial da Poesia
Parabéns Joan Sebastian
(histórias de um dia que é só um,
embalado em óbvia redundância)
Escrevo atrasado, semi-desleixo,
ainda mais que a primavera se antecipou,
mas vi as árvores, estavam lá
e nos ramos guardavam todos os poemas
que não sei escrever
e que agora eclodem
em matizes de verde.
Sei que os vou ler,
Tenho até ao outono!
domingo, 6 de março de 2022
GR11-E9 (Parte 3) - Fonte-da-Telha - Praia do Meco
E pronto: esta completada a ligação. Trafaria-Cabo Espichel… já posso dizer que caminhei de uma ponta a outra. Faltava o pedacinho entre a Fonte da Telha e a Praia do Meco - por causa da Lagoa de Albufeira estar aberta para o mar, durante o verão - mas agora que é inverno, o vento, as marés e as ondas, repõem a areia no canal de ligação, fechando-o e possibilitando a travessia na ponta mais ocidental da lagoa.
Faço-o com a ligeireza despreocupada de quem caminha pelo prazer de andar e de passar e ver.
Ao Norte, muito ao norte, outros caminham, desesperados, na busca do maior dos bens – a Paz - enquanto outros, empurrados pelo capricho narcísico de um louco, se afadigam a negar-lhes a dignidade de Ser, a qualidade de Humano.
Sorvo o oceano com o olhar. É infinito, parece, mas não é assim.
Também a guerra há de acabar. Resta-me essa certeza. Parco consolo para mim, que, com a sorte que me dá o acaso de aqui viver, só a sinto pelos ecos das televisões ou dos serviços de Internet, ou ainda pela constatação das filas para abastecimento dos combustíveis, que galopam na escala dos preços; indiferente postulado para os que nela se vêm envolvidos, sem outra coisa terem feito que se afirmarem nação, como os acordos, assinados e reconhecidos pelo agressor, o dizem.
O sol ergue-se sobre a linha do horizonte: por baixo, o mar azul; por cima, a luz que o sol lhe deita, amarela.
Até o dia se pinta nas duas cores mártires….
Este é um percurso sem história. É plano; escolhi a hora da maré vaza para evitar ter de caminhar em areia solta e não chegam a ser dez quilómetros. Passa pouco das sete horas da manhã. O sol já nasceu e está fresco o dia, com algumas nuvens, mas sem ameaça de chuva. Deixo o carro no fim da estrada alcatroada, já cá em baixo, na Fonte da telha. Optei por ir sempre pela praia e não pela arriba, contornando as instalações da NATO. Verificado no Google Earth, a distância é a mesma e evito o inconveniente de poder encontrar alguma areia solta no ladear da lagoa, que teria que fazer, caso viesse por esse lado.
Tiro a primeira fotografia – o local por onde começo - e, passo a passo, lá vou seguindo pelo caminho de terra batida até ao seu fim. Os surfistas parecem ter tomado este local, a julgar pela construção que encontro e que está deserta, mas que tem todo o ar de ponto de encontro e convívio dos intrépidos deslizadores, guardada por uma curiosa escultura de uma cauda de … golfinho (?) feita de pedaços de madeira atirados pelo mar para a praia.
A partir de aqui, tem que ser pela areia, mesmo. E lá vou eu, bem junto à linha de água, onde o chão é mais firme, com passo estugado, que a marcha nestas condições é fácil e prazenteira.
É março, e as mimosas estão floridas. Aqui e ali, intensas machas amarelas maculam o verde que alastra até ao início das arribas. É pena ser uma invasora que causa grandes problemas a outras espécies autóctones, porque o quadro é bonito de se ver.
Mexilhões asa de anjo, uma estrela do mar, búzios, conchas diversas…. Nos dias de mar agitado é comum cruzarmo-nos com eles no areal.
Estou já a chegar à Lagoa de Albufeira, e vislumbro um vulto escuro sobre a areal. Aproximo-me. Sinto o cheiro pútrido da decomosição e reconheço a forma de um golfinho, morto, sobre o areal. Não posso deixar de notar que está mutilado; sem algumas barbatanas.
Hei de ler mais tarde que é algo vulgar este tipo de encontros e a explicação para a mutilação é tão triste quanto simples: enredados nas redes de arrasto, os animais são içados para os barcos e os pescadores, para não danificarem as redes, mutilam os corpos aos animais, porque geralmente é pelas barbatanas que se encontram nelas presos. Espero que, pelo menos, as pobres criaturas já estejam mortas quando lhes cortam o corpo. Se assim não for, o crime é a todos os títulos, hediondo!
Já depois da Lagoa, uma neblina sobe do mar para a praia, alguns pescadores tentam a sorte de corrico, mas os robalos parecem não estar para aí virados…
Alfarim. Está quase. Decido ir novamente pela baixa arriba que a partir daqui se ergue de novo, passada que está a lagoa. 25 metros a subir pela areia solta, com paragem para tirar uma rápida fotografia a uma belíssima linária que se cruza no meu caminho e chego novamente à estrada, que logo perco para seguir pela caminho que cruza a mata até ao meu destino final.
Linaria Polygalifolia |
Praia do Meco. Cheguei. Sento-me numa pedra e telefono a pedir boleia para o regresso, como combinado.
O visor do telemóvel mostra um total de 9,77 km percorridos enquanto o sol, amarelo, brilha sobre o mar, azul.