sexta-feira, 16 de maio de 2025

  Notas de viagem roubadas a um diário que não escrevi,

em partes, tantas quantas me promete a memória...

19 de Abril de 2025 - Khiva 

Último dia de visita... amanhã um dia inteiro de viagem me espera até rodar de novo a chave na porta de casa. 

Entretanto hoje, por ter ficado instalado bem dentro do centro histórico tenho a oportunidade de fazer o que sempre procuro fazer quando tenho oportunidade: sair para a rua antes do nascer do sol e do pequeno almoço, para poder fotografar na paz do silêncio e da ausência de pessoas, em particular de pessoas como eu... turistas...  ruído que somos sobre as paredes, céus, casas, monumentos, com o nosso insaciável apetite por mais uma selfie que vez alguma veremos, por mais uma fotografia que vez alguma mostraremos, por mais uma imagem que vez alguma terá utilidade... 

Fotografar, para mim, e suspeito que para muitos dos que o fazem por algo mais que encher um cartão de memória com  um hábito que sobre nós desceu com a modernidade tecnológica que nos acompanha, é tanto um gosto, uma procura artística, quanto uma catarse.

Que fique claro: não me considero nenhum fotógrafo de aptidão superior, mas, sem falsa modéstia, creio-me um praticante relativamente aclarado desta forma de expressão artística, embora esteja longe de dominar a tabela de conteúdos de uma manual exaustivo da arte fotográfica. Também porque tal não me interessa. Sou um empirista; outros dirão um mero diletante... pois seja. Alicercei em prática, ao longo de anos, conhecimento dos aspetos técnicos da fotografia e da teoria da composição, os dois esteios fundamentais de um bom pedaço de papel impresso, para pendurar na parede lá de casa... 

Sou de mim o meu melhor crítico, até porque ninguém costuma ver as fotografias que faço, como acontece com quase todos nós. Mas a verdade é que das horas que qualquer fotógrafo que se preze dedica, de alguma forma, a rever e "revelar" as imagens que recolhe, grande parte delas são gastas num contínuo processo de análise, de pergunta resposta sobre coisas tão díspares como a equilíbrio da composição, convergência de paralelas, saturação, contraste ete, etc.

E para este trabalho é fundamental o que o alimenta: a imagem.

Que procuro, sempre que possível nas condições que irei ter agora durante cerca de hora e meia, sem outra distração que os meus passos, ou a ocasional pessoa que por mim passa para ir abrir a porta de um monumento, as poucas pessoas com que me cruzo, ocupadas na limpeza da rua; uma ave desconhecida que me salta à vista e me desvia o olhar por algum tempo, até desaparecer atrás de um edifício.

Como tudo é mais claro: as linhas, as cores, as formas...

depois é juntar o puzzle; procurar que as peças encaixem, o que nem sempre é fácil apesar da qualidade inquestionável das peças. É aí que entra o equilíbrio, a busca assertiva da composição a que o acervo inconsciente de tanto folhear de livros ou páginas eletrónicas, de visitas a museus a exposições nos impele, nos mostra o caminho, sem que tenhamos necessidade de nos questionar, ampliado, formatado, educado que está o nosso olhar.

Para isto:


ou isto:


No espaço de hora e meia percorro praticamente todo a Itchan Kala (que é relativamente contida, um retângulo de setecentos por quatrocentos metros), com a oportunidade de olhar com olhos de ver, transportando em mim a felicidade da despreocupação e do puro prazer, que tento cristalizar com disparos do obturador.

Um casal vem a entrar por uma das portas da muralha e olha-me com curiosidade, retribuo o olhar e aceno-lhes com a mão, retribuem-me o aceno e dirigem-se para mim, tentamos conversa... percebo que me perguntam de onde sou; respondo; retribuem com o inevitável "Ronaldo". Tinha vontade de lhes responder, "Não, Pedro.", mas não iriam perceber a piada....

Poso para uma selfie com os dois; fotografo-os também. Mais tarde, iria encontrá-los de novo na rua e com eles trocar os sorrisos que fazem de nós pessoas e não meros animais.

Retorno ao hotel, para o pequeno-almoço e o início oficial do dia.

De novo na rua fico com a impressão que algures na procissão das horas terá tocado uma campainha e que todos os visitantes que se acoitavam nos vários alojamentos que existem dentro das muralhas teriam saído para a rua ao mesmo tempo....

"Ainda agora aqui não havia ninguém...", digo para com os meus botões, enquanto seguro na máquina fotográfica que levo pendurada no ombro, sem sequer pensar em a levantar à altura dos olhos....


Entrada da Kunya Ark, a velha fortaleza

Madraça de Maomé Raxim

 
Madraça Maomé Amim Cã 

O belo e inacabado Miarete Kalta Minor

Percebe-se que a rota da seda é parte da herança cultural que aqui se promove como chamamento turístico, tantas são as estátuas com este tema que encontrámos na viagem

Os altivos minaretes de Khiva:  mesquita de Juma e madraça de Islam Khodja



Mausoléu de Paclavã Mamude




 Madraça de Alaculi Cã


Madraça de Kutlug Murad Inak 

Madraças de Arab Muhammad Khan e de Maomé Raxim



 o casal que encontrei no fim do meu passeio.

Sem comentários:

Enviar um comentário