quarta-feira, 7 de maio de 2025

 Notas de viagem roubadas a um diário que não escrevi,

em partes, tantas quantas me promete a memória...


15 de Abril de 2025 -  Samarcanda 

Mausuléu Gur Emir


Tamerlão, já aqui o disse, foi um notável patrono das artes e da arquitetura, para além de um não menos notável sádico que encarava o terror e a crueldade como forma de afirmação e domínio, o que, de qualquer forma, não é assim tão fora de contexto para um soberano da idade média.

Pensando bem, hoje, longe que estamos da idade média, a crueldade e o terror continuam a ser vetores de afirmação de indivíduos claramente descompensados emocionalmente, que  não hesitam em infligir no próximo as maiores provações e sofrimento, num exercício de um qualquer prazer obscuro, mascarado sob a capa de uma pretensa superioridade moral, religiosa, ética, rácica...

Pior ainda é saber que impulsionadas por  conjugações viciosas de circunstâncias muitas vezes facilmente anuláveis se para tal vontade existisse  (e lembro-me de um refrão do Sérgio Godinho: a paz, o pão, saúde, educação), hordas de seguidores toldados no mais ínfimo discernimento racional, elevam a um pedestal demiúrgico figuras que a história, a coberto do distanciamento que o tempo, as evidências e a reflexão fazem emergir, apontará em futuros compêndios como vergonhosas manchas no currículo da evolução humana....

Tamerlão morreu em Samarcanda e aí está enterrado, num mausoléu originalmente por ele mandado erguer para enterrar o seu neto o sultão Muhammad, que, no local mandara erguer uma madraça. hoje em ruínas.

O seu túmulo em Jade é central na sala que alberga também os túmulos dos seus mais diretos descendentes  - filhos e netos - deslumbrantemente decorada a ouro e azul e que num dos lados ostenta uma vara de madeira encimada por um feixe de crina de cavalo, indicação de que estamos perante um local sagrado.

Deixo-me por ali estar um pouco,  tentando obter algumas fotos sem a intrusão de outras pessoas, virado para a parede com a vara de madeira. Quase a conseguir o meu objetivo, uma pessoa acerca-se do canto da imagem que espreito pelo visor. senta-se.

"Que raio, este está a ver-me aqui e vai mesmo pôr-se à frente..." penso, mas logo me arrependo. Sou eu o intruso. A pessoa que em frente ao túmulo se sentou ora, percebo agora, pela forma como coloca as mãos. Envergonhado, sou eu quem sai da sua frente, deixando-lhe o espaço que não exigiu mas que lhe pertence por natureza.


Ruy González de Clavijo foi embaixador de Henrique III rei de Castela, à corte de Tamerlão. O seu nome é recordado numa das ruas que dá acesso ao mausoléu, que começa muito perto da rotunda que alberga a grande estátua do soberano. 



Portal de entrada para o complexo do mausoléu de Gur Emir











alguns detalhes do pátio que dá acesso ao edifício do mausoléu



O interior do mausoléu, com a sua faustosa decoração a ouro e azul.






Nas traseiras do mausoléu, bem como no interior do mesmo, algumas bancas com os habituais souvenirs locais.











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