quinta-feira, 21 de março de 2024

  Dia Internacional da Árvore

Dia Mundial da Poesia
Parabéns Joan Sebastian Bach
(histórias de um dia que é só um,
embalado em óbvia redundância)



Procura

por detrás de cada árvore
por detrás de cada ramo
por detrás de cada folha
por detrás de cada flor
por detrás de cada pétala
por detrás de cada estame
por detrás de cada palavra
por detrás  de cada silêncio
tudo, mas mesmo tudo, tem um verso.

É tão fácil o poema!

terça-feira, 30 de janeiro de 2024

 

Mês a mês, contado à vez


X - Janeiro

 Olho-me triste. Seco e mudo.

Talvez por pecado de voz

ou outro ainda, maior que tudo,

que me condene ao frio algoz

de um  silêncio que me desquieta.


Calado, sou busto em pedestal

ou velho rádio sem sintonia.

Onde o canto? Onde o sal

da terna luz da  harmonia,

que me preenche e me completa?


Quisera-o agora na garganta;

sentir-lhe o frémito que urge em som,

sublimada gota de  vontade tanta

que parece coisa de estranho dom...

Quisera-o agora … mas não adianta.


IX - Dezembro

Uma ténue vírgula de ar

em frase escrita a nevoeiro

guia os olhos de um olhar

que me olha por inteiro,

baixo  a cima, e me pergunta

se o ano fez bem as contas

ou se tanta miséria junta,

tantas mortes tontas,

são obra do acaso.


Eu, que com o mundo me inquieto

e do mal dos homens me interrogo, 

falho de letras no alfabeto

para resposta, que não arrogo, 

cabisbaixo-me impotente,

em respeito envergonhado:

tomara fosses diferente

ano reles e malfadado, 

que de bom só tens ocaso!

VIII- Novembro

Mais vem o vento por estes dias

a siflar forte em desafino,

temperado de sal e maresias,

sem lugar de onde e sem destino.

E rodopia e saracoteia

e sobe a rua, como se gente,

desliza bruto, tudo pateia

ou já mansinho, que nem se sente,

sopra nas folhas, muda-lhes a cor

fá-las voar e já cansadas

tombam ao chão, lágrimas sem dor

que douram tristes as calçadas.

E rodopia e saracoteia

e sobe ao céu a descansar

e, enquanto sobe, esperneia

de encontro às nuvens sempre a rodar,

toma-as nos braços em despudor

e são um só até cansar,

e elas choram de tanto amor,

esfumam-se em água, já são só ar…

Mais vem o vento por estes dias,

não traz consolo nem mais alento,

só manhãs escuras, húmidas e frias,

qual noite em dia triste e cinzento,

e saracoteia e rodopia

na minha cara, como que a gritar,

que o sopro certo da invernia

também um dia me vai levar!



VII - Outubro

Outonal, a sombra cai.

Fosse folha e não metralha,

fosse lábio e não navalha,

sobre a terra que se esvai

em púrpuro rio e se amortalha 

de virgens vozes, 

                            deus me valha…


esse, que os homens inventaram

para que ele os inventasse...


É de ódio a maresia

que tudo galga e acoberta,

pútrida maré, ferida infecta.

Tudo é escombro, até o dia.

Fértil enchente que deixa e espalha

tão vil essência, 

                             soez, 

                                       canalha!


essa, que esventra corpos como o teu

ou soterra gritos, que jamais saberás gritar. 


Em razão de quê? em nome de quem?

Se ele é um e é de três,

porque não o és também, 

                                                   Jerusalém?


VI - Setembro

Sigo as estrelas e sigo-as só,

no firme lamento de um firmamento

em breu solvido,

que mete dó,

por minha escolha, e meu intento.

Queixa não tenho.

Só a vontade,

tecida a passos, de abrir caminho.

Não tarda é dia e a claridade

far-me-á em sombra: 

não mais sozinho.

Pouco procuro: apenas ser

de tudo um pouco. 

Parco pedir,

Mas inda assim, tamanho querer…

Será possível? Vou conseguir?

Sigo as estrelas, a sua estrada,

como antes outros e outros depois,

serei só pó, ténue pegada,

desvanecida por mil sóis

e pelo vento, no seu passar.

Mas restará de mim a prova,

como me atrevo a reclamar, 

que era falsa a ilustre trova

do nobre vate, que eu declino,

correndo o risco de o enfadar:

Caminante, sí! Hay buen camino!

Só tens é que o procurar…


V - Agosto


A gosto, escrevo-te quente,

que o dia arde e eu também, 

em mês de pasmo e mês de gente,

cadente de estrelas num vaivém,

ferida de céu, incandescente.


Fora só isto e bastaria

mas anda estranho o firmamento,

tanto que me perguntaria

de quem o poder ou o talento

que urde tamanha magia.


É que há no mês estranha teia,

sem par nas folhas do anuário…

Só sei que alguém teve a ideia

de baralhar o calendário

e pôr em dobro a lua-cheia.


IV - Julho


Que bem que vão todos na areia:

o menino, corpinho ao léu;

o papá põe óculos, para a apneia;

a mamã a corar tudo o que é seu;

o lulu a esgravatar a maré cheia;

a menina a ver se há namorado;

a ti-tia a chamar pela filha:

"Não vás para aí; está agitado.

Anda comigo à conquilha".

O velho verga-se à geleira,

que o dia está longe do fim,

enquanto atira à praia inteira:

"Olhá bolinha de Berlim!"

O instagram quase que explode

com tanta foto de beldade

"É só mais uma, antes qu'engorde",

que consciência não é vaidade...

 

Passeiam lentos de mão dada,

quais Dom Quixote e Dulcineia,

enchem a tarde ensolarada,

que bem que vão todos na areia...


III - Junho


Dia a dia, alastra o  dia...

Faltam-me as estrelas, será?

Tamanha monocromia

de céu azul ao deus dará

nada acrescenta, só me cansa.

 

Mas tão só o tanto cresce,

logo o dia se amingua,

pois tudo aquilo que sobe, desce

e atrás do sol vem sempre a lua,

sei-o seguro, desde criança!


II - Maio

 

O Bom Pintor tudo pintou

de verdes tantos e tantas cores.

... e ao sétimo dia,  descansou,

p'ra contemplar os seus labores.


Mas tudo isto numa só semana?

Como quer ele que se acredite?

São 31 dias, já  não me engana,

por mais que alguém o diga e cite.


P’ra que se saiba, aqui declaro

que em tal patranha eu só não caio,

como até acho que é descaro:

Se tudo é verde, é porque é Maio!

I - Abril


Descansa agora bom abril, 

bem o mereces, por inteiro,

sussurra um céu azul anil,

que faz do dia travesseiro


Lençol de trigo eivado a flores,

tela de artista, aguarela

de todas e mais outras  cores,

qual delas a mais pura e bela...


Descansa pois meu bom abril,

descansa que eu daqui não saio;

só não trouxeste as águas mil...

será que as deixaste p'ra maio? 

domingo, 3 de setembro de 2023

 


 Fora eu Henrique, por sete mares andado

fora eu casco, vela, cordame, ou mesmo vento

fora eu espuma a brotar do teu calado

fora eu peixe voador, assobio agoirento

fora tudo ou nada disso, ou outros tantos desvarios  

e teria mais para fazer que ficar a ver navios…


Como é bonita a nossa Sagres!









Frederyk Chopin - Polónia

Capitán Miranda - Uruguai


Cuauhtémoc - México



Dar Młodzieży - Polónia



Georg Stage - Dinamarca


Atyla - Espanha




PS. Se alguém me quiser ajudar com os nomes nos navios, agradeço....



sábado, 27 de maio de 2023


Da dúvida e da troca


Fosse a  honra ou a virtude

fosse estar bem de saúde

fosse um porvir lisonjeiro

fosse ter muito dinheiro

fosse perene alegria

fosse viver mais um dia

fosse um cargo no governo

fosse ser p'ra sempre eterno

fosse casa na Caparica

fosse ganhar o benfica

fosse certo que te amava

e outras coisa que não vejo

meu amor tudo trocava

por um beijo frente ao tejo...


terça-feira, 23 de maio de 2023

Um conto de praceta 

Corroios, num fim de tarde, com chuva.




As duas árvores olham-se, de amor tomadas.

Gratas pelo vazio que sobra nos bancos, agora que o céu deu em chorar, (talvez pura inveja das nuvens) e que os avôs, quotidianos companheiros do correr do nada,  tornaram a casa para se protegerem das grossas lágrimas, ousam o que calam no ardor do segredo.

"Amo-te", disse uma.

A outra, coquette armada, fingindo surpresa, responde tão  baixinho, que só quem soubesse ler a tremura pueril das folhas - e a companheira bem o sabia -  ouviria igualmente o delicado protesto: "Eu também!".

Envergonhado por me ter admitido em tamanho segredo, voyeur de fim de tarde, estugo o passo, não sem antes lançar olhar um último olhar aos improváveis amantes.

Atónito, descubro então a surpreendente verdade: as árvores quando  coram....ficam lilases! 

segunda-feira, 1 de maio de 2023

 Mês a mês, contado à vez.


I - Abril


Descansa agora bom abril, 

bem o mereces, por inteiro,

sussura um céu azul anil,

que faz do dia travesseiro


Lençol de trigo eivado a flores,

tela de artista, aguarela

de todas e mais outras  cores,

qual delas a mais pura e bela...


Descansa pois meu bom abril,

descansa que eu daqui não saio;

só nao trouxeste as águas mil...

será que as deixaste p'ra maio?