terça-feira, 26 de outubro de 2021

Notas de viagem roubadas a um diário que não escrevi,
em partes,
tantas quantas me promete a memória


24 de Agosto

Saímos cedo, bem cedo de Aranda de Duero. Tanto assim que pudemos presentear-nos com um belo nascer-de-sol  a romper por sobre a campina, como se os girassóis lhe esperassem a luz para de novo se altanarem,  cabisbaixos que estavam enquanto se acossavam uns aos outros no escuro da madrugada.


Sobe a estrada que nos leva até à primeira caminhada programada de várias que escolhemos fazer estas férias. Não muito longas, que estamos sempre de passagem e também porque temos as nossas  inerentes limitações de caminhantes de fim-de-semana, mas, ainda assim queremos andar. Pelo caminho delicio-me com as paisagens tomadas pelas nuvens que a inversão térmica da noite criou. Deixamo-nos guiar pelo Google maps mas, às tantas, perdemos o sinal… não importa, seguimos em frente. Estamos perto, é sempre a subir até ao cume. Somos dos primeiros a chegar ao parque de estacionamento. É cedo ainda. Pessoas que passaram ali a noite em auto-caravana tomam o pequeno almoço com a mais deslumbrante das vistas. Procuro o início do caminho e seguimos em frente, para umas horas de bom passeio, aqui e ali mais duro, porque nem sempre o terreno é fácil, mas vale bem a pena o esforço.

São várias as lagoas e começamos pelas que nos estão mais perto, lagoa dos Patos e Lagoa Brava, não sem antes trocarmos os "bons-dias" com alguns cavalos que por ali pastavam calmamente.



Lagoa dos Patos

Lagoa Brava (sim, juro que está atrás dos cedros)

Ambas as Lagoas vista a partir do caminho para a crista que bordeja as lagoas Negra e Larga

A vista mais interessante, no entanto, está lá em cima, na crista que circunda as lagoas Larga e Negra, por isso atacamos a subida, que nos vai levar dos 1875m de altitude do parque de estacionamento até aos 2050m  do marco lá colocado.

Esta um dia bom para caminhar, e apesar de ser sempre a subir, lá atingimos o nosso objetivo, sorvendo depois a bela vista panorâmica que se nos oferece, acompanhados aqui e ali  pelo sorriso colorido da quita-merenda (Colchicum montanum), um endemismo ibérico,  por entre o amarelo da parca vegetação já seca.

Quita-merenda (Colchicum montanum) 


Lagoa Larga (mais próxima) e Lagoa Negra

A mania da "mariolas" também por aqui passou, como não podia deixar de ser. Eu tenho mais que fazer que brincar às pedrinhas e sigo em frente, até porque a minha companhia já se adiantou bastante enquanto eu tirava mais um ou duas fotografias. chegamos ao fim da crista e agora o caminho deveria levar-nos para a lagoa da cascata, mas temos de encurtar o passeio e seguimos para a base da Lagoa Negra por um estreito e difícil carreiro íngreme de pedra solta, com o cuidado que a ocasião demanda.



Uma vez  cá em baixo, o caminho é fácil e plano, até ao parque de estacionamento, correndo em torno das duas lagoas que, lá de cima, avistámos. Antes de chegarmos ao fim da estrada que se segue à trilha de terra batida, ainda conseguimos vislumbrar a lagoa da cascata, lá em baixo... talvez numa outra visita.... quem sabe...


 

Procuramos a sombra dos pinheiros negros que circundam o parque de estacionamento. São horas de almoço e o local é propício, por isso aproveitamos para comer enquanto descansamos do excelente passeio da manhã. 

Refeitos e satisfeitos, partimos, que o dia ainda tem muito que dar. O nosso destino para a noite é Tudela, mas antes, já perto de lá chegar, vamos deixar que a tarde nos leve pelas  cores de mais um daqueles sítios que não se esperam e se descobrem com um misto de espanto e contentamento: Bardenas Reales.

Gessos e argilas e luz, muita luz, refletida numa orgia de brancos, ocres e rosas que contrastam cada vez mais com o azul do céu à medida  que o sol desce no horizonte.

Terra mãe? o colo da terra?

Ficava aqui mais tempo. Gostava de voltar aqui muitas mais vezes, em várias altura do dia, em várias alturas do ano. só tenho um dia e aproveito-o o melhor que posso. a estrada, a berma o chão, tudo ´uma camada de pó fino, caulino, gesso, a roupa, os sapatos, o carro, tudo fica cheio de pó, apenas a máquina e as lentes me preocupam, e tento protegê-las o melhor que posso; ultima paragem, nos 30 km de estrada que percorrermos devagar, ao ritmo das muitas fotos que tirámos: Cabezo de Castildetierra, a imagem mais conhecida de um local que me era desconhecido. Para proteger a formação é proibido chegar perto dela, o que é excelente para os fotógrafos também, porque assim a podem fotografar sem a intromissão de pessoas... isto é, seria assim se um idiota de um turista não resolvesse furar a proibição e pisar onde não devia.. felizmente  parece não ter havido estrago e o pateta lá se foi embora, sem perder o ar de parvo com que me olhou (deve ter percebido pelo meu olhar que eu não estava propriamente a sufragar o seu tonto ato...)






A turista italiana vestida de vermelho até que estava no sítio certo, à hora certa....


Cabezo de Castildetierra


Fotogenia também na estrada à saída do parque... 

O parque, com estatuto outorgado pela UNESCO de reserva da Biosfera  fecha por vezes, fico a saber pela minha pesquisa na internet... é um campo de tiro para a força aérea também,... mesmo no meio do parque existe uma instalação militar com este fim, estranho....

Rumamos cansados a  Tudela. Está o dia feito e o corpo pede descanso e o aconchego de um bom jantar e de melhor cama. 

 


Sem comentários:

Enviar um comentário