Notas de viagem roubadas a um diário que não escrevi,
em partes, tantas quantas me promete a memória...
13 de Abril de 2025 - Tashkent - o mercado
Já o disse inúmeras vezes... até em textos deste meu blog que, também ele, parece um bazar, tamanha a falta de unidade narrativa e de propósito que por ele serpenteia: tenho um enorme prazer em visitar mercados e feiras...
Dirá quem leia e me não conheça que sou talvez candidato a qualquer coisa, conhecida que é a sanha dos candidatos a tempo inteiro por um ósculo bem molhadinho com sabor a escama ou por um abraço efusivo entre dois ramos de salsa e a frescura de uma penca. Não é assim. Candidato sou, mas apenas a tentar perceber um pouco mais quais os hábitos e consumos básicos de uma sociedade que não é a minha. E os bazares, os mercados, são compêndios insubstituíveis para um tal estudo.
Já por aqui falei disso, mas tirando os mercados que de tal só têm o nome e mais parecem loja de centro comercial ou parque temático, em que a maior parte dos visitantes são não locais, um mercado genuíno é uma montra social insubstituível, como o são também, em grande medida os transportes colectivos.. ambos genuinamente recursos de massas, o que contrasta enormemente com os recursos que caracterizam as gentes de massas...
Por esta razão tinha grande curiosidade em visitar o mercado de Tashkent, o Bazar Chorzu.
O primeiro aspeto que nos intriga ao chegar a uma das entradas do mercado é o facto de se encontrar, em grande medida, albergado debaixo de uma enorme cúpula de 30 metros de altura e 80 metros de diâmetro, mas este é o maior mercado de Tashkent e esta é uma cidade de 3 milhões de habitantes, pelo que a dimensão deve ser também ponderada à luz desta variável.
Lá dentro, as bancas correm concêntricas em várias filas, separadas por tipo de oferta. Carne, legumes, arroz, lacticínios e, pasme-se, Kimchi...
Leio mais tarde que existe uma significativa comunidade Coreana no Uzbequistão, descendente de expatriados à força... mais uma das boas ações desse escoteiro-mor que dava pelo nome de Josef Stalin....
Uma mezzanine corre toda a circunferência da cúpula, estando ocupada com os vendedores de frutos secos e especiarias.
Fora já da cúpula, outras secções, nomeadamente bancas de doces, onde provei sumalak, uma pasta doce com consistência de caramelo líquido, feita à base de malte de trigo e a área dedicada à panificação, bem como alguns pequenos restaurantes.
O ambiente é o de um qualquer mercado genuíno, com os vendedores a fazerem o seu melhor para promoverem o seus variados produtos, seja pela apresentação, seja pela oferta para prova, seja pela persuasão oral e os compradores pulando de banca em banca, na procura do melhor preço, sabendo de antemão que aqui é necessário ser-se um perito na verdadeira "Art of the Deal" (e não a que o trafulha que assenta por estas dias na Casa Branca, diz ter escrito).
Por certo haveria já um bazar no local onde, em 1980, foi erguido a actual cúpula em 1980. numa curiosa e feliz combinação de arquitetura modernista soviética com o azul das muitas cúpulas que se vêm pelo Uzbequistão
Os motivos geométricos que tão frequentes são na artes decorativas islâmicas, parecem também ter sido fonte de inspiração para o tratamento interior da grande cúpula.
A mim, que observava o bulício de um dia normal de mercado, todo o conjunto se me assemelhava a um daqueles grandes piões de lata que, quando pequenos, fazíamos rodopiar, carregando para cima e para baixo um êmbolo central. Não que com isto queira tecer qualquer consideração menos abonatória sobre a interessante edificação, mas a verdade é que a sensação de movimento que me provocou o aspeto circular de toda a construção, exacerbada pelas linhas concêntricas de bancas, irradiando do Grande pilar central, e que acho transparece das fotografias, é óbvia.
Já as bancas de carne ainda que também elas arrumadinhas, terão, pela natureza do produtos e pela diversidade de origem dos mesmos um ar não tão apelativo para visitantes de convicções mais assépticas, nada que pareça preocupar quem aqui se desloca à procura d um bom bife de cavalo ou de um pedaço de camelo para guisar..
Uma das vendedoras de Sumalak, com um enorme tacho do dito, acabado de preparar e que, generosamente, me deu a provar.
Navat - cristais de açucar elaborados a partir de sumo de uva, tradicionalmente utilizados para adoçar o chá.
Por dia, milhares de pães saem dos fornos. Quentinho, acabado de sair do formo, o pão era como todo o pão.... delicioso.
Apesar de grade parte do país ser ocupado por um extenso deserto, o meado de Tashkent estava repleto dos mais frescos vegetais... já vendê-los, com tanta oferta disponível, não deve ser tarefa fácil, a julgar pelo semblante preocupado do vendedor...
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