segunda-feira, 10 de junho de 2024



 VI - Caminha - Mougás

14/Setembro/2023 






Espanha à vista... bastava atravessar o rio, mas primeiro que tudo houve que retemperar o estômago com um delicioso pequeno almoço com direito a leite com  café quente... como sabem bem os pequenos luxos, quando deles nos alheamos por uns tempos.

Fora do hostel, dois taxis, cortesia do alojamento,  compareceram para levar os caminhantes e as respetivas mochilas até ao embarcadouro na borda do pinhal onde o pequeno barco aguardava para assegurar as travessias. Um vento danado quase me fazia voar a credencial e os envelopes que tirei da mochila para carimbar com o último carimbo em solo nacional.

A viagem de barco foi naturalmente curta, que a foz do Minho não é imensa, e entre salpicos salgados e bofetadas do vento lá fizemos a travessia que acabava no anticlímax de um muito simples desembarque no areal, sem passadiço nem nada... toca a saltar do barco e ...já está.

Mochila assestada, tomei de novo o caminho sobre a areia, facilitado pelo passadiço que sobre ela corre na orla do pinhal onde vários pinheiros foram pintados nos troncos com versões de símbolos celtas que, parecendo, por vezes, meras marcas brancas sobre o castanho da casca das árvores,  vistos a partir de localizações assinaladas nos passadiços, ganham formas concretas.

O dia ia muito claro e limpo e os primeiros quilómetros, sempre junto ao mar,  foram de verdadeiro prazer, temperado a iodo e sal e gritos de gaivotas que me iam acompanhando enquanto me dirigia para A Guarda, primeira cidade no percurso, onde contava parar para me abastecer de selos espanhóis para assegurar o envio dos meus envelopes, ao longo dos mais de dez dias de percurso que ainda tinha pela frente.

A chegada à Guarda foi  como reencontrar um velho conhecido, pois ainda há não muito tempo tinha ali estado, num cinzento dia de chuva no regresso de Santiago, onde tinha ido ver uma peça de teatro com a minha filha.

Consultado o "maps" para ver onde ficava o posto de correios, fiquei a saber que teria que atravessar a vila toda, que por acaso se desenvolve numa encosta relativamente pronunciada, para lá chegar, mas como há sempre forma de ver senão o lado bom, pelo menos o menos mau nas coisas, tive a oportunidade de passar pela praça principal - Praza do Reló -  onde fica a câmara e o turismo, onde juntei um bonito carimbo bicolor, azul e verde, ao meu caderno de viagem, que a moça do posto tanto gabou, com um entusiasmante "Ai, que bonito!".

Selos comprados, mais um café tomado e A Guarda ficou para trás, enquanto ia calcorreando o agradável caminho à borda de água. Rapidamente cheguei a uma estranha construção no meio das rochas, com uma forma circular que de longe parecia uma piscina que fiquei depois a saber chamar-se a  Cetária Redonda. 

Cetárias eram nada mais que viveiros de marisco, construídos tirando partido de piscinas naturais, onde eram mantidas e criadas lagostas, santolas e outras espécies que depois era vendidas e consumidas. Esta cetária chama-se "a redonda" devido à sua forma e terá sido construída em 1895.


A parti daqui,  as indicações do caminho fazem-no infletir encosta acima, largando mais uma vez a borda de água para procurar uma cota mais alta e talvez mais protegida por sombra mas, decididamente, muito menos interessante. Soubera eu que se podia continuar por baixo, como agora me parece ser possível, consultado o Google Earth, e teria seguido em frente, já que chegado ao nível da estrada, o caminho faz-se ou paralelo a esta ou pela sua berma durante o resto do trajeto, até se chegar a  Oia, o que não tem piada alguma, para mais vendo o mar a chamar, lá em baixo, ao longo da maior parte do trajeto.

Uma parada em Portucelo, para uma cerveja e um ovo cozido de véspera, e só voltei a tirar a mochila das costas ao pé do mosteiro de Oia, que não visitei porque cheguei já depois da hora de fecho da manhã.

O calor já apertava e aproveitei para me dessedentar e descansar um bom pedaço antes de me fazer de novo ao resto do caminho que, agora sim, seguia de novo bem perto do mar, em terra batida, até infletir de novo para a estrada nacional, por alturas de dois pequenos ilhéus mesmo junto à costa, as ilhas orelhudas, diz-me o fiel Google.

Já na estrada, nada mais há que contar a não ser os quilómetros que vão deixando de faltar até chegar a Mougás, termo da etapa. O problema é que o meu lugar de pernoita era dois quilómetros monte acima, e lá tive que os fazer, já a acusar o peso, o calor e a fome, até, por fim chegar ao alojamento: uma casa onde ficaria com mais 3 moças que a dona do Alojamento me disse serem Russas, mas que se me apresentaram como Ucranianas... de qualquer forma, quase não tive contacto com elas, pois chegaram bastante mais tarde do que eu.

Rotina habitual, desta vez até com máquina de lavar roupa, pelo que aproveitei para lavar calças e tudo, só que a máquina não centrifugou e ficou tudo encharcado. Como não havia sol tive medo que a roupa não secasse até ao fim do dia mas, por sorte, a coisa compôs-se e eu pude ficar com as minhas vestimentas se não bem lavadas, pelo menos passadas por água.

Comida também era coisa difícil porque ali, onde estava, não havia nada onde a  comprar. Valeu-me haver em casa alguma massa e ovos no frigorifico, e ovos estrelados com farfalli não é coisa para se deitar fora.... O jantar foi uma pisa, descongelada na altura, no bar do "Centro cultural de Mougás", local onde as forças vivas da vila, cerca de 10 pessoas, provavelmente todos primos, passam sempre algum tempo para dois dedos de alta algarviada ou para uma caña fresquinha.

Jantado e arrumada a mochila recolhi ao sossego do quarto, para uma noite bem dormida, já o único sol que existia era o dos candeeiros de iluminação pública.


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A foz do Minho

O barco no regresso para novas recolhas e travessias

O último reduto Português antes de Espanha: o forte de Santa Maria da Ínsua

Os símbolos celtas nos pinheiros da praia do Muiño

outra vista para o forte

a omni-presença de símbolos Cristãos, principalmente cruzes e cruzeiros, é notória na Galiza,


o mar e os despojos que atira para terra

Salinas romanas do Seixal, Sec. I

A Guarda já lá ao fundo...

... e aqui à entrada...

...manhã cedo ainda, o que tornava tudo mais colorido e contrastado... bonito ia o dia!

Um café da Praza do Reló
.
Até as casa de banho públicas são fans do caminho e do marisco, por estes lados.

A cetária redonda





E o caminho sobe... quando devia continuar em frente....

... porque agora, o mar está lá em baixo...

...lá bem em baixo.

Como quase sempre, era eu e a minha sombra quem marcava o caminho, e era companhia mais do que suficiente....



Mosteiro de Oia

Um espantalho peregrino

O pôr-do-sol em frente a Mougás...

foi a última vista que tive enquanto saboreava a pisa "gourmet", descongelada na altura, no Centro Cultural de Mougás.

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